Repercussão da Depressão na Família Contemporânea
A humanidade convive com a
depressão há muitos séculos. Foi na Grécia, nos anos 400 a 300 a.C., que
Hipócrates, descreveu esse distúrbio com o nome de "Melancolia” e
considerou a tonalidade sombria do estado de ânimo, a alteração do sono, a
anorexia, a secura na boca e as náuseas, como os seus sintomas principais”.
Acreditava ser uma disfunção dos "homens", mais precisamente da
"bílis negra", de onde deriva o nome melancolia. (ALEXANDER &
SELENICK apud MORAES, 1997).
A Depressão é um problema
de Saúde Pública, que interfere na dinâmica social e na qualidade de vida do
indivíduo. Pode ocorrer em todas as
faixas etárias‚ sendo muitas vezes camuflada pelo grupo familiar, quando, no
entanto, poderia ser solucionada no seu início.
De
acordo com LIMA et al. (apud LIMA, 2000),
um estudo conduzido em Pelotas (RS) mostrou que as pessoas que apresentam mais
de dois eventos vitais (mudanças identificáveis no padrão de vida que
representam uma ruptura do comportamento usual e afetam o bem-estar do
indivíduo) têm duas vezes mais chance de apresentar transtornos psiquiátricos
menores do que aquelas que não tiveram nenhum evento no último ano. Os eventos
estudados foram separação conjugal, perda por morte de ente querido, perda de
emprego, acidente com lesão corporal, assalto, migração e presença de familiar
com doença crônica no domicílio, ocorridos no último ano.
Outro
dado apontado pelo estudo de Pelotas (RS) foi o Estresse crônico. As condições
que em longo prazo trazem dificuldades como financeiras e nas relações
interpessoais, e ameaças permanentes à segurança do indivíduo aumentam as
chances de ocorrerem transtornos psiquiátricos.
Entende-se por doença
crônica aquela que se caracteriza por longa duração ou por recorrência
freqüentes dos sintomas (Dictionary of the English Language, 1996).
A depressão quando não
tratada poderá tornar-se crônica e apresentar repercussões intensas junto à
dinâmica familiar. Os critérios diagnósticos para classificar a distimia são
tratados detalhadamente no capítulo 1. O
maior volume de pesquisas neste campo aborda as doenças degenerativas, que ao
longo da história apresentam dificuldades para a família, o paciente e o
médico. Adota-se neste trabalho a perspectiva de que a depressão quando não
tratada ou a depressão resistente ao tratamento farmacológico, como qualquer
outra doença crônica, afeta a dinâmica familiar.
WELLS et al. (1989)
citam que o funcionamento físico de pacientes com sintomas depressivos é
significativamente pior que o daqueles que sofrem de problemas pulmonares e de
coluna. E, o problema social é pior do que aqueles que sofrem de angina,
problemas pulmonares, gastrintestinais, de coluna, hipertensão, diabetes
mellitus e artrite.
No âmbito da doença física, particularmente da doença
crônica, o foco da preocupação é o sistema criado pela interação de uma doença
com um indivíduo, uma família ou algum outro sistema biopsicossocial (ENGEL
apud MCGOLDRICK, 1995).
Classificar as doenças com base em critérios puramente biológicos, esquecendo os fatores psicossociais, pode, em determinadas situações, levar a polarização dos diagnósticos e prejudicar o tratamento. ROLLAND (1995), propõe um modelo de classificação das doenças crônicas no qual o fortalecimento do vínculo entre os mundos biológicos e psicossociais tende a esclarecer melhor o relacionamento entre a doença crônica e a dinâmica familiar.
Em certo sentido, a família deve estar pronta a restabelecer a estrutura de crise para lidar com as exacerbações da doença. A tensão sobre o sistema familiar é causada tanto pela frequência das transições entre crise e não-crise, quanto pela contínua incerteza de quando ocorrerá a próxima crise. Igualmente, a grande discrepância psicológica entre os períodos de normalidade versus doença é um aspecto particularmente opressivo, característico das doenças crônicas reincidentes.
Uma família tem como fonte
poderosa de estresse um indivíduo portador do distúrbio depressivo maior em
algumas situações, ao lado de outros fatores como a ocupação, a situação
político-financeira do país, socioeconômica familiar e a própria constituição
física ou emocional do grupo familiar (FRIEDMANN et al., 1997; LIPP, 1995).
Quando, no entanto, a família faz cobranças em excesso e
a expectativa de apoio e carinho não é preenchida, o retirar da máscara social
se torna difícil e, às vezes, é até‚ prejudicial (BROWN, 1995).
É natural uma pessoa se sentir
deprimida e decepcionada quando sua família, em vez de lhe dar o apoio
necessário, a trata com indiferença ou usa o conhecimento que tem de suas
fraquezas e dificuldades para criticá-la.
O estresse associado às
doenças crônicas na família se manifesta mesmo quando o doente não é o filho,
mas também quando se trata dos pais. Na realidade, se a vida da pessoa
portadora de uma neurose é difícil, inevitavelmente também o é a vida das
pessoas que a cercam. A família, como uma
unidade, sofre com isto, e o estresse nestas situações é sempre grande (LIPP,
1995).
Uma maneira mais
parcimoniosa de lidar com alguém assim instável é não ceder tanto aos seus
desejos e caprichos. Todos na família necessitam de atenção e de ter algumas de
suas necessidades satisfeitas. Não se deve sacrificar o bem-estar de todos em
prol do de uma pessoa só, que seja exigente e difícil.
O melhor que os familiares
podem fazer é encaminhar tal indivíduo para uma terapia que possa ajudá-lo na
busca do alívio da neurose e a viver de modo mais adaptado.
Referências Bibliográficas
LIPP,
M. E. N. O Impacto do Stress na família.
Cadernos de Pesquisa – NEP, Ano I, n.1 e 2, UNICAMP, Campinas, SP, 1995.
MORAES, J. L. R. de. Depressão no Hospital Geral. Dissertação
de Mestrado, Centro de Ciências da Saúde, UFPE/PE, 1997.
ROLLAND,
J. S. Doenças Crônicas e o Ciclo de Vida Familiar. In: CARTER, B. & MCGOLDRINCK, M. As mudanças no Ciclo de Vida Familiar. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.